27-JUN-2010 ULTRA-TRAIL SERRA DA FREITA

Pois é... cá vem o ultra-maratonista da ACB com mais uma Ultra.

O que é "doidice" para uns é um puro prazer para outros

Esta prova tem vindo de ano para ano a exigir cada vez mais de cada participante, tornando-se neste momento a Prova mais dura do Trail Nacional. Quando tinha 51 km, fazia-se em 7h30, No ano passado passou a 60 km e completei-a em 9h34. Este ano passa a 70 km... e prevejo completá-la em 12h00.

É mais exigente do que uma prova de 100 km!!

E... já estou inscrito com as cores da ACB e espero estrear lá a nova camisola!!

Site da Prova:
http://www.confraria-trotamontes.com/utsf/

Apesar dos vários avisos por parte da Organização, de que nesta edição mais de 50% dos atletas iriam desistir (o que na minha opinião não é motivo de satisfação por parte de nenhum organizador de qualquer evento!!), não resisti ao encanto da maravilhosa Serra da Freita e resolvi inscrever-me.

Só vai quem quer e ninguém é obrigado a tal!!

Pelo "briefing" do dia anterior depreendi que não seria tarefa fácil e que seria uma prova de extrema dureza. A informação de que o limite da prova seria de apenas 15 horas também não iria ajudar. As condições climatéricas prenunciavam de que o veredicto inicial se iria concretizar em desistências independentemente da dureza da prova.
O calor intenso que se verificou iria causar estragos no pelotão!

A primeira metade da prova seria igual à do ano passado e resolvi fazê-la num ritmo mais lento que no ano anterior, tendo-a completado em pouco mais de 6 horas. Embora sem conhecer o resto do percurso, tinha-me mentalizado num tempo final entre as 12h30 e as 13 horas. Mas o calor que se fazia sentir já me dificultou a dura subida até aos 35 km. A torneira do abastecimento aos 31 já tinha sido como um oásis no deserto. Graças ao apoio do Zé Carlos Fernandes lá consegui superá-la.

Cada "pocinha" de água que surgisse lá íamos ambos encher o chapéu para refrescar a cabeça e as ideias. Depois do Trilho dos Incas, aos 40 km, já se viam demasiados desistentes. O Zé Carlos seguiu e eu continuei sozinho. A subida até ao ponto mais alto da prova perto dos 45, deixou-me com tremendas cãibras. O calor era demais, e as paragens para descansar tornaram-se frequentes.

A angústia era tanta que pensei em desistir no próximo abastecimento. Felizmente a Serra tem destas coisas e subitamente caíu uma trovoada precedida de granizo.

Animado e acompanhado dum atleta alemão que alcancei resolvi continuar. Aos 50 apanhei o Guilherme Hora que tinha decidido desistir bem como outros atletas. Decidi não desistir e segui com o alemão. O percurso até aos 60 km considero-o o mais bonito da prova, percorrendo vinhas, os taludes de água do Rio Teixeira e pinhais. A subida até às eólicas também é dura! Nesta subida, o alemão deixa-me só e segue caminho. Sou alcançado pelo Mimoso, o David e outro atleta que rapidamente desaparecem no topo. A descida para Agualva era boa se conseguisse correr!

Aqui, aos 60, resolvo descansar por bastante tempo! Com a companhia do Artur e da Estela lá me determinei a seguir. Mas reduzia o ritmo mal apareciam as ameaças de cãibras.

A subida até aos 64 km é bastante acentuada, por um trilho que mal se vê rodeado de vegetação que encobre as pedras traiçoeiras e o risco de queda é proeminente. Aqui alcançamos o atleta alemão que desistia! Tanto eu como o Artur e a Estela, tentávamos conseguir chegar dentro do tempo limite!

Na descida para a Castanheira acabo por ficar só de novo até chegar ao abastecimento que repudio. Água por água... prefiro a da fonte que está mais fresca e sempre dá para molhar a cabeça.

A descida para a Ribeira retirou-me completamente o prazer que sinto numa prova de trail, passando a ser um sofrimento. As pernas não obedeciam e as quedas sucederam-se. Recebi ajuda dum outro atleta que me alcançou e ambos ajudámos o Mark Macedo que se arrastava devido a um entorse num pé. Se houvesse necessidade de evacuar aqui um atleta, como seria?
Para mim, um Trail não é subir penedos de gatas, descer de rastos e agarrar-me a correntes com os bastões entre-dentes.

Chego à Ribeira aos 67 onde ainda se encontra o Artur e a Estela. Um pouco antes encontra-se um atleta deitado em sofrimento, juntamente com alguém do abastecimento que lhe dá água.

Ligo á minha esposa que me diz que o Moutinho lhe afirmou uma vez mais, que seriam desclassificados todos os atletas que chegassem depois das 15h00 de prova. Tenho pouco menos de 15 horas no meu cronómetro e prevejo mais uma hora para chegar ao final. Não ganho mais por isso e a prova para mim já é desumana, pelo que não justifica o sofrimento. Fico por aqui!

Apesar dos incentivos da Estela e do Artur, dou por terminada a minha prova. Nada se justifica quando se coloca em causa a minha saúde e o meu discernimento. Chama-se a ambulância para levar o atleta caído e esperamos pelo Mark que não aceita desistir e continua. Admiro a sua tenacidade! Chega a Célia que tenta persuadir-me a continuar, mas já tinha decido terminar. As dores não passavam e não quis arriscar.

Chego ao Parque de Campismo onde sou acolhido com entusiasmo pelos amigos. Aguardo pelo Artur e a Estela para os felicitar por terem completado tão dura prova apesar do seu desespero por não serem classificados. Inconcebível!

Pergunto ao Moutinho quanto tempo iria ele fazer nestas condições! De certeza que não seriam as 15h00, pelo que a decisão irredutível da organização é simplesmente inaceitável. Acabam por "queimar" uma das provas mais emblemáticas do Trail em Portugal.

Para mim, o UTSF nestes moldes, deixa de pertencer ao meu calendário.

Foi a primeira vez que desisti numa prova de trail, tendo feito 67 km dos 70 previstos, com um tempo de 14h48'.
Um tempo superior ao que costumo fazer numa prova de 100 km!
Houve quem demorasse 1h30 para fazer estes últimos 3 km, quase como escalada.

Para a história ficam 149 atletas à partida, com 69 chegados dentro do tempo limite (+15 fora do limite), e com 44% de desistências.

Altimetria da prova:

Carlos, acabei agora mesmo de ler a tua "aventura" e só te digo que no final o que me saíu foi: PORRA, QUE LOUCURA
De facto essa prova é uma autêntica loucura de dureza
E mais ciente fico dessa dureza, quando vejo um atleta dos mais experimentados e bem preparados que conheço, ver-se obrigado a DESISTIR a 3 km da meta, porque de facto já não podia mais
Ainda assim a tua prova foi, para mim, simplesmente fantástica
Só espero que recuperes o mais depressa possível de mais esta "batalha"
Já agora gostaria de sugerir o seguinte: que tal, no próximo ano, por a organização da prova a participar na mesma Não é por nada, era mesmo só para ver se os meninos conseguiam, também, terminá-la nesse tempo limite de 15 horas
De facto se a estupidez fosse música... que grande orquestra teriamos nós, neste cantinho à beira mar plantado

Bem... eu até estou com vergonha de dizer, mas eu também fui à Freita.
Fui numa de ver até onde é que dava, para curtir a paisagem e tal. Mas cheguei aos 40 e encostei, eheheh. Já tinha 9 horas e tal nas pernas e eu ainda tinha esperança de vir a fazer outras corridas. Claro que já estava fora do tempo limite (que parecia folgado, não era?), mas nos 2 últimos km -a descer - demorei 1,30H !!!!
Achei que já tinha da serra o que queria (também já não me deixavam prosseguir e eu não fiz questão nenhuma,eheh).
Mas foi giro.

Tenho mais relatos no meu blogue.
As próximas são o Raide e TNLO.

Carlos e Fernando,

Desculpem-me por só agora vos vir aqui felicitar...

Fernando, verdadeira aventura e grande dose de loucura?!

Carlos, loucura é contigo mesmo! Tens uma capacidade fenomenal para suportar um sofrimento desta natureza. Que pena a inflexibilidade (e estupidez) da organização!
És um verdadeiro herói!

Um grande abraço aos dois, com os meus parabéns (em particular ao Carlos).

Venha de lá essa "pequena" aventura chamada "Raid Melides-Tróia", onde espero marcar presença...apenas no final para dar um abraço aos estreantes e repetentes!

Obrigado Jorge.
De facto o Carlos foi vítima do rigor despropositado do limite de tempo e de ter sido contactado a informá-lo de que não haveria condescendência para os retardatários, o que veio a ser corrigido (com justiça para todos os que acabaram, mas com injustiça para os que abandonaram por via disso - e que deveriam ter sido informados atempadamente da tolerância).

Foi que foi uma prova interessante e linda, não haja dúvidas.

Venha a UMA.